Crítica: Meu pé de laranja lima

Meu pé de laranja lima, livro de José Mauro de Vasconcelos, já foi traduzido em 12 idiomas e publicado em mais de 30 países, incluindo a Coreia do Sul, onde uma versão em quadrinhos foi publicada com páginas ilustradas. A obra que já tem 45 anos vendeu mais de 1 milhão de cópias no Brasil, o que faz dela um dos maiores sucessos editoriais de nosso país.

O potencial dramático da obra nunca havia sido ignorado, mas até então era explorado apenas pela teledramaturgia. Entre 1970 e 1998, foram três versões, uma na extinta TV Tupi e duas na Rede Bandeirantes, sendo a mais recente a que se tornou mais popular. Faltava para este clássico da nossa literatura uma versão cinematográfica à altura de sua grandiosidade. O diretor Marcos Bernstein conseguiu capturar o espírito da obra e entrega um filme comovente, nostálgico e de uma beleza que não se vê há muito tempo no nosso cinema.


Meu pé de laranja lima conta a história de Zezé, o filho do meio de uma família que vive em meio à pobreza numa cidade no interior de Minas Gerais. Arteiro, hiperativo e falante, ele sonha em um dia sair dali, voando com os irmãos para um lugar melhor. Sua imaginação é fértil, e ele se refugia em um mundo de fantasia para esconder-se do sofrimento de sua vida cotidiana, tendo como melhor amigo uma pequena árvore de seu jardim. Ao iniciar uma improvável amizade com Manuel Valadares, a quem chama carinhosamente de Portuga, ele iniciará uma jornada de amadurecimento e enfrentará sua primeira grande perda, que será determinante em seu destino.

Marcos Bernstein desenvolve com perícia a premissa básica do romance, que retrata uma infância problemática, mas que encontra na fantasia um alívio para as dores da vida. A narrativa é desenvolvida de forma simples e objetiva, e os personagens são bem apresentados e trabalhados. Meu pé de laranja lima impressiona exatamente por esta coerência na estrutura, o que é compreensível, já que mesmo que este seja apenas seu terceiro filme, Bernstein possui uma vasta experiência como roteirista (ele trabalhou nos roteiros de sucessos como Terra Estrangeira, Central do Brasil e O Xangô de Baker Street).

Na estética, o trabalho realizado no filme é extraordinário. A fotografia de Gustavo Hadba é bela e lúdica quando o foco são os sonhos e fantasias de Zezé, fazendo um contraponto às imagens pesadas e brutas da pobreza do interior do país. Como o foco do filme não é a questão da desigualdade ou simplesmente a questão social, este recurso é utilizado apenas com o objetivo de causar este contraste, e funciona. O que se vê na tela é um perfeito equilíbrio entre poesia e entretenimento.

O elenco é uma surpresa basicamente pelo par de protagonistas. Obviamente que o garoto João Guilherme Ávila, que interpreta Zezé, é a grande estrela. Filho do sertanejo Leonardo, ele mostra muito carisma nesta estreia e é a força motriz do filme. Como o Portuga, José de Abreu faz um trabalho soberbo, que apaga qualquer vestígio do personagem asqueroso que até recentemente interpretou no sucesso da TV Avenida Brasil. O ator confirma sua versatilidade e vai arrancar lágrimas de você sem precisar praticamente de qualquer expressão facial: ele vai te vencer apenas com um olhar. Genial.

Algumas pessoas questionaram por que Meu pé de laranja lima não foi lançado na época das férias escolares. Bem, não é exatamente um filme feito para crianças. A classificação indicativa de 10 anos nos cinemas já diz alguma coisa, e as cenas fortes estão lá. Por isso pense bem antes de levar os pequenos para assistir. 

Meu pé de laranja lima é o Cinema Nacional buscando renascer das cinzas com a ajuda de um dos mais belos livros-poema da nossa literatura. Obrigatório para quem ainda guarda um pedacinho da infância dentro de si.

Cotação: ***

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