Crítica: Argo

Durante as décadas de 70 e 80, o mundo passou por grandes transformações políticas e sociais, muitas delas diretamente ligadas ao apogeu da Guerra Fria, o conflito ideológico entre Estados Unidos e União Soviética. Alguns dos maiores erros norte americanos no tocante à política externa tomaram forma durante este período, alguns deles com consequências bastante contemporâneas (o fortalecimento da Al Qaeda de Osama Bin Laden, que levou ao atentado às Torres Gêmeas do WTC, é um dos mais representativos). 

Filmes que tem como pano de fundo esta época complicada da nossa história recente não são novidade em Hollywood e em outras escolas de cinema ao redor do globo. Mas nenhum deles apresentou um tema tão interessante quanto a história de Argo, o novo filme de Ben Affleck.


Argo se passa durante a crise dos reféns, um incidente diplomático entre os Estados Unidos e o Irã que se arrastou por mais de 400 dias e teve como consequências, dentre outras, a derrota do então presidente americano Jimmy Carter para o ex-ator Ronald Reagan e a ascensão do prestígio e influência do líder xiita Aiatolá Khomeini no Oriente Médio. Para resgatar um grupo de norte americanos que escapou da tomada embaixada americana em Teerã e estavam escondidos por autoridades canadenses, um oficial da CIA planeja uma ação audaciosa: entrar no país como um pretenso produtor de cinema e se juntar aos refugiados, que se passariam por profissionais da industria cinematográfica em busca de locações exóticas para um filme de ficção científica, o Argo do título.

Esta impressionante história real ficou por anos fora do conhecimento público, até ser exposta durante o governo de Bill Clinton. Seu potencial para um grande roteiro é facilmente notado, mas esta parece ser a hora perfeita para o projeto ter saído do papel, uma vez que os filmes que se passam, de alguma forma, nos bastidores de Hollywood são a mais nova moda do cinema (só em 2011 tivemos A invenção de Hugo Cabret, O Artista e Sete dias com Marilyn, todos filmes que partilhavam desta premissa). Mas o que mais impressiona em Argo é a forma madura como a história foi dirigida, mérito de Ben Affleck, que a cada novo trabalho mostra que tem tudo para se tornar um dos diretores mais competentes da nova geração em Hollywood. Seus dois últimos projetos (Medo da Verdade e Atração Periogosa) já eram excelentes, mas aqui o diretor mostra mais segurança e um manejo impressionante da linguagem para sequencias de ação e suspense.

Argo tem algumas caras conhecidas no elenco, mas os maiores destaques são John Goodman e Alan Arkin. Os dois veteranos protagonizam algumas das melhores cenas do longa, cortesia dos diálogos ácidos que alfinetam a indústria americana de cinema sem cair em clichês. O roteiro também acerta no prólogo, que situa o expectador na problemática da época sem indicar mocinhos ou vilões. Affleck também soube dosar o caráter social e político do roteiro com sequencias visualmente impactantes (a invasão da embaixada é uma das mais significativas), e planos inteiramente construídos a partir de fotografias reais da época. Um trabalho de reconstituição histórica que deve ser aplaudido de pé.

Embora ainda insista em protagonizar seus filmes (apenas em Medo da verdade cedeu o lugar ao irmão, Casey Affleck), Ben Affleck não compromete o resultado final de seu filme com sua atuação como o agente Tony Mendez, o responsável pela operação de resgate. O personagem não exige complexidade dramática, pois o roteiro prefere focar a natureza soturna de sua personalidade, algo compreensível para um profissional especializado a dar suporte em ações clandestinas da agencia de inteligencia americana. Mas se em cena Affleck não impressiona, por trás das câmeras não há o que apontar de erros em seu trabalho em Argo, o que já o credencia para lutar pela cobiçada estatueta de melhor diretor no Oscar 2013.

Se alguns anos atrás uma cartomante fizesse uma previsão do meu futuro e me dissesse que Ben Affleck se tornaria um de meus diretores favoritos, provavelmente eu teria dado uma grande risada e pedido meu dinheiro de volta. A industria do cinema tem mais este grande diferencial: sempre consegue te surpreender.

Cotação: ****

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