Crítica: O Vingador do Futuro (2012)

Não é todo mundo que gosta desta nova onda de remakes. A ideia de macular o legado de um grande filme com uma revisão capenga assombra os cinéfilos desde que coisas como o Psicose de Gus Van Sant foram lançadas. Mas há de se colocar um parênteses: nem sempre os filmes são materiais originais, logo, um remake poderia apenas ser uma visão diferente de uma mesma história, como o recente A fantástica fábrica de chocolates, de Tim Burton.

Com um dos maiores sucessos da ficção científica da década de 80, não é diferente. Paul Verhoeven dirigiu O Vingador do Futuro com um roteiro que era adaptação de um conto de Phillip K. Dick, o papa da ficção científica que inspirou filmes como Blade Runner, O pagamento e Minority Report. Como qualquer adaptação, Verhoeven transpôs sua visão para a obra literária, criando um filme que utilizava de maneira inteligente os recursos visuais disponíveis à época, criando um espetáculo com efeitos especiais de primeira. 

Mas estamos em 2012, mais de 20 anos depois do filme de Verhoeven. E já não existem limites para o que os cineastas conseguem fazer com efeitos especiais. Len Wiseman (o cara por trás da infame série cinematográfica Anjos da Noite), diretor acostumado com cenas de ação e filmes de espalhafatosos efeitos especiais, recebeu a missão de entregar uma nova versão para o conto We Can Remember It for You Wholesale. Este O Vingador do Futuro é o resultado desta empreitada, um filme realmente diferente do anterior. E com bastante personalidade.


Optou-se, inclusive no Brasil, por manter o título do filme original neste novo projeto, o que na minha opinião não foi a decisão mais acertada. Se a ideia era reproduzir uma nova versão do conto com mínimas referências à produção anterior (algumas estão lá, como a prostituta de três peitos, um dos ícones da cultura pop), um novo título seria o caminho mais adequado, principalmente por aqui, em que a tradução já não era lá essas coisas. É interessante notar que toda a evolução tecnológica contribuiu eficientemente em tornar as sequencias muito mais impressionantes visualmente, mas que os fãs poderão perceber em pequenos detalhes as homenagens que são feitas ao trabalho de Verhoeven.

A escolha de Wiseman como diretor não trazia muita credibilidade ao projeto, pois a carreira do cineasta não é das mais brilhantes. É uma surpresa perceber que ele trouxe as melhores qualidades de seus trabalhos anteriores para o filme, que é nitidamente mais focado na ação e perde pouquíssimo tempo com diálogos longos e cheios de explicações, mesmo tendo uma trama tão complexa quanto a do seu antecessor.

Para o papel que um dia foi de Schwarzenegger, foi chamado o mais franzino - porém bem mais talentoso - Colin Ferrel. Ele vive Douglas Quaid, um operário que não está satisfeito com sua vida monótona em um mundo pós-apocalíptico em que os seres humanos se espremem nas pouquíssimas faixas de terra habitáveis que restaram após uma guerra química de grandes proporções. Frequentemente perturbado por sonhos que ele acredita serem mais do que realmente parecem, ele vê sua vida virar de ponta cabeça depois de visitar a Recall, uma empresa de alta tecnologia que prometia a seus clientes momentos de prazer com memórias implantadas diretamente no cérebro, em que as pessoas poderiam ser o que quisessem. Quaid passa a ser perseguido pelo governo, descobrindo-se líder da resistência à tirania que assolou o planeta e único capaz de livrar seu país de um destino trágico.

Ferrel se sai bem como o protagonista, principalmente nas sequencias em que descobre que sua realidade não era exatamente o que parecia. A base do roteiro de O Vingador do Futuro é passar para a platéia uma sensação constante de dúvida, para que a todo momento exista uma contestação de que o que está acontecendo é realmente realidade ou se trata de apenas mais um sonho de Quaid, advindo das memórias que teriam sido implantadas pela Recall. O ator transparece este sentimento com perfeição, o que ajuda o filme a funcionar. Por outro lado, a inspirada presença da atriz Kate Beckinsale (esposa do diretor e parceira constante de trabalho, tendo sido também a protagonista da franquia Anjos da Noite) é outro bônus: a moça esbanja sensualidade com a mesma facilidade que chuta traseiros, e seu embate com o outro interesse amoroso do herói, vivido pela não menos exuberante Jessica Biel, rende bons momentos para os marmanjos de plantão.

Para ser um filme ainda melhor, só faltou a O Vingador do Futuro mais capricho com alguns aspectos técnicos, como por exemplo montagem e trilha sonora. Ficções com temas futuristas são terrenos férteis para inovações no ritmo, mas o diretor optou por seguir a cartilha dos filmes de ação, sem ousar demais. Para a música, a escolha de Harry Gregson-Williams era um indicativo interessante pelo seu curriculum bastante diverso, que alterna trabalhos em épicos, animações e muitos filmes de ação, embora não tendo um tema específico que tenha ficado na memória do público. Ele desenvolve uma trilha apenas mediana, que não acrescenta muito à ação, diferente, por exemplo, do que foi feito por Hans Zimmer em Inception

O Vingador do Futuro pode ser considerado uma das surpresas desta temporada. Mesmo com números de bilheteria modestos, ele comprova que é possível, sim, revisitar o passado e apresentar grandes sucessos com outra roupagem para um novo público. Desde que a qualidade exista, a origem da obra não é tão importante assim. 

Cotação: ***

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