Crítica: Para Roma com amor
Para uma história funcionar, por melhor que seja seu argumento, ela precisa de personagens bem construídos. No cinema não é diferente. Por este motivo, um cineasta que sabe criar tipos tem tudo para ser por demais bem sucedido no mundo da sétima arte. E neste quesito, Woody Allen é incomparável.
O septuagenário diretor de sucessos como Hanna e suas irmãs, A Rosa Púrpura do Cairo, Match Point e do recente Meia Noite em Paris continua sua viagem pela Europa, desta vez fazendo ponto na Itália. O país, que tem na sua história gênios do calibre de Federico Fellini, Roberto Rosselini e Michelangelo Antonioni, não está passando pelo seu melhor momento na produção cinematográfica. Talvez por este motivo, a homenagem de Allen à Roma e os tipos que preenchem seus becos, ruelas e avenidas tenha saído na hora ideal.
Em Para Roma, com amor, Woody Allen volta a utilizar uma narrativa de histórias paralelas - como em Todos dizem eu te amo e Melinda e Melinda - e um bem dosado realismo fantástico, para conduzir a jornada de um grupo de personagens que, em suas vidas cotidianas, deixam-se constantemente levar pela paixão, o que trás as mais imprevisíveis - e hilariantes - consequências.
Mas ao olhar de Woody Allen, paixão não se resume apenas à flecha do cupido: também ficamos cegos pela paixão que temos pelo trabalho, por nosso estilo de vida, por nossos sonhos, e até mesmo pela paixão que sentimos por nós próprios. O diretor trança suas histórias em Para Roma, com amor discutindo estas diferentes visões, com Roma como pano de fundo visual e musical.
Na forma, Para Roma, com amor não se distancia nem um pouco dos outros trabalhos do diretor: suas escolhas no manejo da câmera e na utilização da trilha sonora continuam impecáveis, mas ele ainda não ousa maiores liberdades neste ponto. Por sinal, inclusive, ele busca imprimir uma certa simplicidade, e se você for observador, vai perceber um boom vazando em algumas cenas, o que é obviamente proposital. A escolha na ousadia fica para as histórias, que embora não sejam todas infalíveis, possuem seus grandes momentos.
Das 4 histórias, a melhor é aquela que narra a visita dos pais de uma jovem americana à Roma para conhecer seu namorado Italiano e sua família. Woody Allen volta a atuar como um empresário musical fracassado que vê no sogro da filha uma valiosa chance de sucesso: ele tem uma voz impressionante para ópera, embora só consiga exercer esse dom quando está debaixo do chuveiro. Em outra trama, temos um casal do interior da Itália que vem para Roma com objetivo de mudar de vida, mas encontram desavenças inesperadas quando um ator de cinema e um prostituta - brilhantemente interpretada por Penélope Cruz, que volta a atuar com o diretor depois do bem sucedido Vicky Cristina Barcelona - cruzam seus caminhos. Também acompanhamos o dia a dia de um homem comum, que vira celebridade sem motivos aparentes da noite para o dia - aqui, o diretor conta com a ajuda de Roberto Benigni para dar uma cutucada nos exageros da mídia e do culto às celebridades. E no arco mais fraco, vemos o alter ego do diretor (que ganha ao mesmo tempo o rosto de Alec Baldwin e Jesse Einsenberg) às voltas com seus desencontros amorosos com a amiga de sua noiva, uma liberal e desinibida atriz.
Trabalhar com Woody Allen é um desejo de nove entre dez atores, por isso o diretor consegue elencos estrelados sem inflar o orçamento de seus filmes (Leonardo DiCaprio, por exemplo, abriu mão de cachê para atuar em Celebridades). O conjunto de atores de Para Roma, com amor é um espetáculo à parte, com uma diversidade que ajuda e favorece a trama. O elenco Italiano, por sinal, é muitíssimo bem representado pelo experiente tenor Fabio Armiliato, além das promessas Flavio Parenti e Alessandro Tiberi. Allen é especialista em dar novos rumos à carreira de jovens atores.
Para Roma, com amor vai te fazer ficar com vontade de dar um pulinho na cidade que é uma joia da civilização ocidental. Se você vai encontrar os tipos simpáticos representados por Allen, não posso garantir. Afinal de contas, esta alma romântica e sensível dos italianos sempre foi muito bonita de se ver nos filmes de Fellini & cia, mas na vida real não deve passar dos muros de Cinecittà. Cinema também é a arte da invenção.
Cotação: ***
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