Crítica: Na Estrada

O Cinema Brasileiro ainda não tem um Oscar, mas já faz tempo que Hollywood percebeu que por aqui existiam muitos talentos. Nunca na nossa história cinematográfica exportamos tantos profissionais, principalmente diretores. Em Hollywood, hoje, temos brasileiros comandando franquias animadas de sucesso (caso de Carlos Saldanha e A Era do Gelo), pretensos blockbusters de verão (José Padilha e seu reboot de Robocop), produções de baixo orçamento em estúdios alternativos (Afonso Poyart, do impressionante Dois Coelhos, o melhor filme produzido por aqui em muito tempo) e, obviamente, filmes feitos sob encomenda para os festivais de cinema. 

Nesta última categoria, propositalmente, não citei diretamente um exemplo. É um caso curioso, pois as produções feitas para festivais seguem caminhos opostos em quase todas as escolas de cinema, e por aqui não é diferente. Enquanto temos filmes impactantes e bem estruturados como Lavoura Arcaica, Cidade de Deus e Cinema, Aspirinas e Urubus, outros tantos filmes vazios e desinteressantes são produzidos e vendidos com entusiasmo semelhante, marketing que faz com que seja considerado calúnia não gostar de uma obra A, B ou C. Neste segundo tipo, se enquadram quase todos os filmes de Walter Salles.

O diretor brasileiro é daquelas unanimidades que são difíceis de engolir: seus filmes são quadrados, repetitivos, geralmente cansativos de assistir e, na maioria das vezes, só valem pelo exemplar conjunto de atores que o diretor consegue agregar ao seus elencos. Na Estrada é a síntese do jeito Walter Salles de fazer cinema, que inaugura de vez o gênero cinema sonífero.



Depois de um início que parecia promissor na carreira internacional, como o road movie Diários de Motocicleta, graças ao prestígio que conseguiu com Central do Brasil, Walter Salles quebrou as pernas em Hollywood ao assumir um filme de estúdio que claramente não seguiu em quase nada (exceto na monotonia) seu estilo de filmar: Água Negra acabou tornando-se um fiasco, um filme de terror sem sustos, uma mancha negra - com o perdão do trocadilho - na carreira do diretor. Depois disso, dois trabalhos interessantes no formato de curta nas produções Paris, te amo e Cada um com seu cinema, juntamente com o mediano Linha de Passe (que fez barulho em Cannes e deu o prêmio de atuação para a atriz Sandra Corveloni) pareciam delinear que havia uma esperança de que os trabalhos de Salles melhorassem. Não foi isso que Na Estrada demonstrou.

O filme que adapta o romance autobiográfico de mesmo título do escritor franco-canadense Jack Kerouac tem muito mais defeitos que qualidades. O roteiro foi adaptado por Jose Rivera, que já havia trabalhado com Salles em Diários de Motocicleta (razão pela qual, talvez, a estrutura da história seja tão parecida com a do filme em questão) e cujo último trabalho foi o sonolento Cartas para Julieta. O texto é arrastado, e em conjunto com o ritmo imposto pelo diretor na montagem, se torna ainda mais desinteressante, com personagens demais e pouquíssimo desenvolvimento da maioria deles. 

Chega a ser um insulto que tipos tão aborrecidos sejam entregues a um elenco do porte e talento tal qual o que foi conseguido por Salles para Na Estrada. Os mais claramente subaproveitados são Viggo Mortensen e Steve Buscemi, cujos personagens não dizem a que vieram e poderiam claramente nem ter sido aproveitados na versão cinematográfica da obra - o efeito colateral mais comum em adaptações mal conduzidas. Entre os personagens principais, não dá para entender o motivo de tanto bafafá para a atuação de Sam Riley, que faz do protagonista uma figura apática (e fica claro que a culpa não é só dele). Garret Hedlund se sai bem como o amigo desequilibrado, mas ainda não mostrou ser capaz de segurar um personagem tão relevante (o que não deve ser novidade para quem viu seu trabalho em Tron, o legado). Mas a decepção fica por conta do elenco feminino, que tinha em Kristen Stewart e Kirsten Dunst seu maior chamariz. Stewart não conseguiu sair do estereótipo de seu personagem em Crepúsculo e Dunst, que vem de um momento glorioso graças a Lars Von Trier e seu Melancolia, está na fita, parece, apenas para preencher espaço.

Interessante notar, no entanto, que o rigor estético de Salles permanece irrepreensível, o que faz o filme contar com uma equipe técnica invejável, e talvez seja seu grande trunfo - o que, no entanto, não o salva de se tornar uma experiência que chega a ser angustiante: os 140 minutos do filme parecem nunca terminar. Salles apresenta um filme bonito visualmente, mas sem qualquer tipo de ousadia visual: para dizer de forma clara, simplesmente mais do mesmo.

Na Estrada não dividirá opiniões: vai cair nas graças da maioria das pessoas que o julgarem apenas pelo nome por trás dos créditos ou pela história que juntou nos festivais ao redor do globo. Se o seu passeio ao cinema for com o objetivo de descansar, será o programa perfeito, só cuidado para não passar do ponto e cair em sono profundo até depois da sessão terminar. Walter Salles não merece um mico desses de você.

Cotação: *

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