Crítica: Sombras da Noite

A parceria entre Tim Burton e Johnny Depp já rendeu ótimos momentos no Cinema, como a inusitada história de Frankenstein que é Edward Mãos de Tesoura; a divertida revisão do clássico A fantástica fábrica de chocolates; o terror com trejeitos cômicos de A lenda do cavaleiro sem cabeça; e até mesmo uma história musical macabra, Sweeney Todd - o barbeiro demoníaco da Rua Fleet. O caldo começou a entornar em 2010, com o grande sucesso de bilheteria Alice no País das Maravilhas, em que o diretor desconstruiu quase que totalmente a clássica história de Lewis Carrol e entregou para seu companheiro mais recorrente nas telas um Chapeleiro Louco que não era nem a sombra do personagem clássico que já havia sido apresentado de maneira antológica pela animação da Disney na distante década de 50.

Não era de se esperar que Tim Burton mudasse totalmente seu estilo para seu próximo projeto, já que estamos falando de um dos diretores mais autorais de Hollywood, e que entre outras esquisitices, tem no curriculum os deliciosos Peixe Grande, Ed Wood e o aclamado musical animado O estranho mundo de Jack. O problema é que seus altos e baixos já estão começando a incomodar até seus fãs mais dedicados, que estão sentindo que já está mais do que na hora do diretor se reinventar e surpreender o público com um projeto diferente do habitual. Sombras da Noite chega aos cinemas para jogar na cara do público que Tim Burton ainda quer continuar a ser o mesmo.


Baseado em um novelão sessentista que foi exibido durante 6 anos nos EUA e teve mais de mil episódios, Sombras da Noite carrega um ar de nostalgia que parecia ser seu grande trunfo, mas que não foi comprado pelas plateias americanas - que fizeram do filme um dos piores resultados de bilheteria da dupla Burton/Depp - e tampouco pelo resto do mundo, que desconhece completamente o material original, não exibido fora das terras do Tio Sam. No filme, Johnny Depp é Barnabas Collins, outrora o mimado filho de um industrial do século 17, que foi amaldiçoado por uma bruxa ciumenta, transformado em vampiro e enterrado vivo por quase 200 anos. Quando desperta, encontra os remanescentes de sua família vivendo de forma decadente e resolve ajudá-los a restabelecer a antiga glória.

Adaptar uma novela tão extensa não é das tarefas mais fáceis, e um prato cheio para furos de roteiro. Sombras da Noite deixa isto claro logo no começo, em que a história de Barnabas e da bruxa Angelique (Eva Green, linda, e com certeza o ponto alto do filme) é contada em poucos e corridos minutos. Depois, os personagens do 'presente' são jogados de qualquer maneira ao público, sem qualquer preocupação em desenvolve-los. Soma-se a isto a indefinição de gênero que permeia quase toda a história, que acaba não funcionando na sua mistura de horror, comédia gótica e romance. 

Mas Tim Burton tem a sorte de estar sempre muito bem acompanhado em seus projetos cinematográficos, motivo pelo qual mesmo fracassos retumbantes de publico e crítica como Planeta dos Macacos e Marte Ataca! conseguem ser filmes belíssimos do ponto de vista técnico. Por retratar a década de 70, detalhes como a direção de arte e trilha sonora teriam grande peso na ambientação, e isso o filme consegue com sucesso de sobra. O maestro Danny Elfman coloca mais uma vez sua música a serviço de Burton e faz mais uma trilha sonora memorável, assim como Rick Heinrichs, outro colaborador frequente do diretor, que ficou responsável pelo excelente trabalho de design de produção (Heinrichs também estará com Burton em seu outro trabalho deste ano, a animação em stop-motion Frankenweenie).

No elenco, além de Johnny Depp, quem acompanha os filmes de Burton verá outras caras familiares, como a esposa do diretor, Helena Bonham Carter, e uma ponta do estupendo Christopher Lee. Mas a presença mais bem-vinda é a de Michelle Pfeifer, que 20 anos depois do sucesso como a Mulher Gato de Batman - o retorno volta a trabalhar com o diretor. Assim como Depp e Burton, Pfeifer era uma grande fã do programa original (reza a lenda que a atriz ligou para Burton e praticamente se convidou para o papel da matriarca dos Collins). Difícil acreditar que um filme tão irregular tenha saído com gente tão talentosa entusiasmada por trás das câmeras. Chloë Grace Moretz (a Hit girl de Kick-ass) também está no filme, explorando seu lado Lolita e tendo em mãos o personagem mais equivocado do longa - a grande surpresa do terceiro ato envolvendo a moça não surpreende ninguém. 

Sombras da Noite termina deixando no ar a impressão de que foi por demais superestimado. Talvez a produção funcionasse se tivesse sido pensada com menos pompa e lançada fora do concorridíssimo verão americano. Como já ficou provado há muito tempo, não são mais astros que seguram os blockbusters e sim personagens. E, convenhamos, Barnabas não tem nem de longe o carisma do Capitão Jack Sparrow, mesmo ambos sendo cria de Johnny Depp. Fica a lição para Tim Burton e nossa esperança de que, no futuro, tenhamos um trabalho arrojado e realmente original do diretor. 

Cotação: **

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