Critica: A árvore da vida

Terrence Malick é um diretor de pouquíssimos projetos. Para se ter uma ideia, desde seu maior sucesso de crítica, o fabuloso filme de guerra Além da linha vermelha, de 1998, ele voltou a dirigir apenas por mais 2 vezes: a primeira, em 2005, rendeu o subestimado O novo mundo, em que ele contou a verdadeira história por trás do mito de Pocahontas, sem os maneirismos necessários para adaptá-la como desenho animado, como foi pela versão da Disney; e agora, com este fabuloso A árvore da vida.

É de se entender o isolamento criativo de Malick. O cinema atual tem pouquíssimo espaço para o tipo de trabalho que o diretor gosta de realizar. Seus filmes não são didáticos ou facilmente palatáveis. Para acompanhar suas histórias, o público geralmente precisa se esforçar para fazer ligações, desvendar mensagens subliminares e, necessariamente, sentir o filme que está sendo mostrado, não apenas assisti-lo. Com A árvore da vida, o cineasta dá mais um passo em seu peculiar estilo, ao traçar de maneira extremamente emocional e com imagens de tirar o fôlego um mosaico cinematográfico que congrega humanidade, ciência e fé.


Malick não poupa esforços para levar o espectador a uma viagem pela história da vida, marcando sua narrativa por imagens impressionantes que simulam a explosão inicial do Universo - o Big Bang - e a criação do nosso mundo como o conhecemos, desde a época em que o planeta Terra era uma bolha flamejante de magma, até os tempos atuais. Com a riqueza de um mini-documentário belamente decupado e cuidadosamente montado, o diretor mostra a evolução da vida, desde os simplórios seres unicelulares, passando pelos dinossauros até aquele que se entende, em seu surto constante de prepotência, a maior criação divina: o homem.

Falar de A árvore da vida sem tocar em temas religiosos é praticamente impossível. O filme já começa com uma citação bíblica de Jó que discorre sobre o que seria a maior graça dada por Deus ao homem. Malick consegue desenvolver seu argumento no filme de maneira primorosa, pois sintetiza o que é a necessidade humana pela fé, alterando imagens de cunho científico que, se pensarmos, deveriam fazer cair por terra toda e qualquer teoria sobre a existência do divino. Esse embate entre ciência e religião, no entanto, não é proposto com objetivo de discutir questões pagãs ou questionar a existência de Deus. Malick deixa clara a importância da graça divina e joga na cara do público aquela que é a maior verdade no senso religioso comum da maioria das pessoas: esquecemos de olhar todas as maravilhas que temos em nossa vida, e só lembramos de Deus quando pretendemos julgá-lo por nos abandonar, seja qual for o motivo.

O mito universal da Árvore da Vida, também chamada de Árvore do Mundo, está relacionado com a gênese do Universo, da Humanidade e do Conhecimento. Esta simbologia é demonstrada de formas diversas na maioria das culturas, sejam orientais ou ocidentais. A Árvore da Vida é vista como a mãe primordial, um elemento feminino que gera e distribuí a vida. No arco principal do roteiro - que segue uma narrativa não linear, alternando fatos que ocorrem no presente e no passado - Malick desenvolve sua visão pessoal do mito na figura de Mrs. O'Brien (Jessica Chastain), uma mãe dedicada que vive à sombra do marido (Brad Pitt), e tem de enfrentar a dor da perda precoce de um de seus filhos. A história da família evolui aos dias atuais, quando temos Jack (Sean Penn), refletindo sobre seu passado e o conflituoso relacionamento com o pai, de quem recebeu uma rígida educação.

A forma como o diretor desenvolve sua trama para juntar as peças das histórias que são contadas em paralelo é um espetáculo de pura poesia, como não se vê a muito tempo no cinema.A árvore da vida emociona pois demonstra todo o poder da sétima arte como ferramenta para contadores de belas histórias.

Apesar de contar com recursos modernos de montagem, fica difícil de acreditar que não houve um trabalho artesanal na estruturação dos planos belíssimos recortados por Malick. Não existem imagens jogadas: tudo foi pensado milimetricamente para se tornar belo ao ser visto na tela. É possível observar uma profusão de plongées e contra-plongées, que procuram mostrar o quanto somos mínimos frente ao esplendor da natureza. Obviamente, essa é apenas uma forma de pensar a mensagem passada pelo diretor, mas fica claro que não existe decupagem ao acaso no seu filme. Tudo está lá para dizer alguma coisa.

Se levará mais sete anos para que Terrence Malick realize um novo trabalho não importa. A árvore da vida é ate aqui o ápice de sua vitoriosa carreira, e a prova de que não é preciso um cesto cheio para que se retire uma fruta boa: basta saber escolher. E o cineasta, como ninguém, sabe escolher um bom projeto. Que o público no mundo saiba reconhecer seu talento e recompense o diretor como ele merece.

Cotação: ****

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