Crítica: Enterrado Vivo

Imagine-se acordando dentro de uma caixa totalmente fechada, tendo à mão apenas um isqueiro e um telefone celular. Você não sabe quem lhe colocou ali, nem onde está localizado de verdade. Seu tempo é curto, pois o ar é rarefeito, e seu único meio de comunicação com o mundo exterior está por um fio - a bateria do celular está acabando. Se apenas de imaginar esta situação você já sentiu calafrios, imagine acompanhar por 85 minutos o desespero de uma pessoa que está, efetivamente, vivenciando este terror.

Não é estranho que até pouco tempo este roteiro circulava com uma etiqueta de "infilmável" nos corredores dos estúdios de Hollywood. Enterrado Vivo está longe de ser um típico filme do cinema americano.

Para começar, Enterrado Vivo é um filme de natureza tipicamente alternativa. Mesmo a presença do astro Ryan Reynolds não conseguiu colocá-lo no primeiro escalão das estréias de 2010. É até compreensível, se considerarmos o roteiro pouco ortodoxo e o fato de o diretor ser um espanhol até então desconhecido pelo público americano.

O fato é que o diretor Rodrigo Cortés teve a audácia de enxergar que era possível transformar o difícil roteiro de Chris Sparling em um filme de verdade. E que filme! Enterrado Vivo é uma experiência cinematográfica assustadora, em que o público acompanha uma história claustrofóbica de sobrevivência sem piscar um segundo que seja. Além disso, o roteiro ágil e com diálogos muito bem explorados é um show à parte, além da presença poderosa em cena do ator Ryan Reynolds, que transborda desespero na pele do refém Paul Conroy, um motorista de caminhão que trabalhava no Iraque para auxiliar as forças de paz americanas em sua atuação no país e que acaba se descobrindo preso em uma situação aparentemente sem saída.

Chris Sparling não poupou seu script de altas críticas a sociedade americana. Alguns momentos são antológicos, como a conversa de Paul com seu empregador ao telefone, em que a empresa inventa uma situação absurda para abster-se de culpa pela situação em que ele se encontrava. Nestas cenas mais intensos é que a estrela de Ryan Reynolds brilha, e o ator entrega aquela que deve ser a maior atuação de sua carreira.

Os momentos de tensão apresentados na película são constantes. Para inserir o público na trama e preparar o terreno para o que estava por vir, o diretor utiliza de forma precisa a trilha sonora incidental - que garante o suspense mesmo quando a tela está completamente preta - e excelentes jogos de imagem, que sugerem amplamente a sensação de impotência e desconforto vivida pelo protagonista. A fotografia e a edição se tornam fatores relevantes, e são realizadas com uma precisão impressionante; difícil alguém sair do cinema e olhar da mesma forma lugares apertados e pouco iluminados.

Em síntese, Enterrado Vivo mostra claramente que o cinema pode, sim, sobreviver apenas com filmes pequenos, desde que a originalidade e o talento de seus realizadores superem a burocracia e a dificuldade que é tocar este tipo de projeto em um mercado cada vez mais tomado pelos milionários Blockbusters. Se a audiência deste tipo de trabalho ficará restrita apenas aos festivais e aos circuitos de arte, ninguém sabe. Mas dá gosto perceber que ainda existe gente perseverante produzindo na indústria do cinema. E dando show.

Cotação: ***

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