Crítica: Harry Potter e as Relíquias da Morte - Parte 1
Diz a lenda que Joanne Kathleen Rowling começou a rascunhar o que seriam os primeiros esboços dos livros de Harry Potter dentro de um café de Edimburgo utilizando um guardanapo de papel, pois a autora não tinha recursos para outro tipo de material na época. Alguns anos e muitos milhões de dólares depois, a inglesa não somente é uma das mulheres mais ricas da Grã-bretanha, como também é responsável direta por um fenômeno sem precedentes na literatura mundial. A saga do menino bruxo reavivou o gosto pela leitura nas crianças, jovens e até mesmo nos adultos, e redefiniu a forma como o mercado editorial iria passar a enxergar as obras de fantasia.
Em 2001, a obra de Rowling tomou de assalto os cinemas, dividindo espaço com Hobbits e outros seres fantásticos. Começava aquela que seria a série cinematográfica mais lucrativa da história do cinema. Dez anos depois, estamos finalmente chegando ao final. E numa decisão ousada do estúdio Warner Bros, o derradeiro livro chega aos cinemas dividido em duas partes, e cercado de expectativa por parte dos fãs. A recompensa é o trabalho mais fiel a obra original já apresentado nas telonas.
Mas fidelidade nem sempre é o suficiente para agradar a gregos e troianos. Como os outros filmes que o antecedem, Harry Potter e as Relíquias da Morte - parte 1 é feito sob medida para os fãs do bruxo, e um tanto confuso para o espectador comum, principalmente aquele que não tenha conhecimento prévio do material original. É um filme construído para o seu público alvo com imensa paixão, e que demonstra nas mais simples sutilezas o quanto aquela história é importante para milhares de pessoas espalhadas pelo mundo.
Se nos filmes anteriores a luta contra o relógio era um problema para o desenvolvimento da trama, aqui temos tempo de sobra para construir situações e personagens. Esta mudança pode ser sentida logo nas cenas iniciais; os três protagonistas, pela primeira vez dividem o centro das atenções do público, e suas atuações são favorecidas pela carga dramática mais acentuada presente na aventura. Na parte técnica, optou-se de vez pelo que estava óbvio: não se tratava mais de um produto infantil. Harry Potter cresceu, e assim também fizeram sua direção de arte, trilha sonora e fotografia. Há espaço até para uma inovação pra lá de bem vinda, que é uma cena inteira animada em computação gráfica, um verdadeiro delírio visual.
Os problemas do livro acabam ficando evidentes na transposição para o cinema, e este fato foi mais agravado pela divisão da película em duas partes. Os longos planos que mostram os personagens vagando sem rumo pelo mundo trouxa às vezes se tornam cansativos, da mesma forma que na leitura. Neste ponto, faltou personalidade ao diretor David Yates, que poderia ter ousado um pouco mais na edição do filme. Mesmo que gerem inicialmente um desconforto na platéia, as cenas são essenciais para criar o clima de solidão e desespero frente ao terror desconhecido ao qual estão expostos os personagens.
Algumas soluções do roteiro devem irritar os fãs mais xiitas. Mesmo sendo extremamente fiel ao livro, foram necessárias algumas alterações na história, e elas ocorrem principalmente para cobrir as arestas deixadas pelos capítulos anteriores. O destino final do vilão Rabicho talvez seja o mais atrapalhado por esta descontinuidade.
Uma das grandes incógnitas para os fãs era como a história seria dividida. O roteiro de Steve Kloves é esperto neste ponto, pois utiliza um dos recursos narrativos do livro como ponto de partida para o desfecho da primeira parte, centrado no desejo do vilão de encontrar a varinha poderosa que seria o seu trunfo frente ao jovem algoz. Quando a cena final começa, você já percebe que um ciclo se fechou, e a cadeira já começa a formigar de vontade de saber como tudo aquilo vai terminar.
O que esperar, então, do filme que encerrará a vitoriosa franquia? Se depender do que foi visto em Harry Potter e as Relíquias da Morte - parte 1, a segunda parte será ainda mais dramática, com o confronto final dentro das terras de Hogwarts, mais mortes de personagens importantes e queridos, e toda a explicação sobre o passado negro de Dumbledore. Agora, é torcer para o tempo passar logo, nem que para isso seja preciso enfeitiçar o relógio com alguma azaração de velocidade. Nos vemos em 2011.
Cotação: ***
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